Resenha: Histórias do Amanhã - Jamila Mafra

Durante milênios, as pessoas buscaram bardos, contadores de histórias e escritores, ansiando por ouvir as histórias de seus antepassados. Por muito tempo, o passado foi contado em rodas ao redor de fogueiras, através de histórias de ninar, de livros de páginas amareladas, e pela boca de quem quer que quisesse contá-lo. É essa a missão da história, afinal: ser contada.

Mas chega sempre um tempo em que tudo muda - o passado já não esconde tantos mistérios quanto o futuro. De onde viemos?, todo mundo costumava perguntar. Agora, com tantas teses e explicações científicas sobre a origem de tudo, a pergunta perdeu seu significado. A questão de agora é muito mais preocupante.

 O que nos reserva o amanhã?

Chega-se a hora de abandonar as lendas, de esquecer o passado e parar de cultuá-lo.

É hora de ouvir histórias sobre o futuro. Talvez assim saibamos o que fazer quando ele chegar.

"[...] Em uma noite sentada à beira-mar, Brianna conversava consigo mesma em pensamento e se perguntava diante de toda aquela paisagem como era possível existir toda aquela beleza do universo em contraste com as farpas ardentes e pontiagudas que destroem a alma dos seres mortais. No caso dela essas farpas eram a doença e a morte. [...] então, mais uma vez ela se questionou: 'O que realmente existe além de todo o universo?'"

[Histórias do Amanhã, as Cidades Submersas - história O Mistério das Estrelas, A Vida de Brianna.] 

Histórias do Amanhã – As Cidades Submersas, de Jamila Mafra, prendeu muito minha atenção pela intenção: um livro de contos sobre o futuro da humanidade - um mundo onde gleleiras derreteram, cidades litorâneas foram totalmente cobertas pelo mar, onde animais não existem fora de zoológicos e pessoas são proibidas de deixar cabelo crescer porque a água não é o bastante para lavá-lo.

O pior é que nada disso é tão improvável assim.

E o livro não decepcionou minhas expectativas.

Eu me apaixonei perdidamente por cada história, tanto pelo clima futurístico quanto pelo bom e velho enredo: são histórias de amor, guerra, amizade, e coragem.

O livro faz repensar o quanto somos burros. O mundo está mesmo sufocando, e mesmo assim continuamos acabando com ele. Somos como peixes destruindo as paredes de nosso próprio aquário, e é uma pena que precisei me tocar disso lendo um livro e não por olhar ao meu redor.

Vai simplesmente chegar o momento em que as Histórias do Amanhã serão as Histórias do Agora. Esse é um livro estranhamente inovador - nada maçante, sem os constantes discursos sobre "Preserve isso, preserve aquilo, jogue aquilo no cesto azul, jogue aquele outro no cesto amarelo". Não é um livro imperativo.

Acho que foi isso que mais me fascinou: o livro não te orienta a fazer nada (não é uma receita de bolo, afinal). Mas, individualmente, cada conto tem sua moral, e a partir dela tomamos nossas próprias decisões e escolhemos que parte da história levaremos em conta: que aquela personagem encontrou o amor de sua vida (que gracinha!)  ou que o egoísmo da raça humana a fez adoecer e morrer antes de poder viver esse amor.

Adorei a forma como Jamila escreve, sem rodeios, desenvolvendo rapidamente o clímax e colocando os finais perfeitos para as histórias de duplo sentido.

Você escolhe se são histórias ou conselhos.

Vale muito a pena ler, independente de como você encare a leitura.

Espero que tenham gostado...